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Críticas

WATCHMEN SÉRIE | Crítica do Neófito (S01E01)

Publicado

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ALERTA DE SPOILER!!!!!!

(Este texto abordará, ainda que minimamente, elementos da trama ocorridos no decorrer da série)

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Eu não sou muito de rituais, mas há um que mantenho de forma “sagrada”: reler Watchmen (HQ de Alan Moore e Dave Gibbons) anualmente.

Incrível como, a cada nova leitura, ainda descubro novos elementos nessa verdadeira e inquestionável obra-prima dos quadrinhos, que ganhou status de literatura na Inglaterra!

A genial composição do “bruxo” rabugento britânico é atemporal, crítica, profunda (sem ser pedante) e inovadora.

 Foto: Divulgação

A história – repleta de flashbacks, falsas reportagens de revistas e jornais, além de trechos de livros, quadrinhos dentro dos quadrinhos, elipses, reviravoltas, mistério, cenas revisitadas por pontos de vista diferentes – escrita há 34 longos anos, representou um marco na 9ª arte, tornando-se referência obrigatória para qualquer autor de arte sequencial.

Após vários ensaios não concretizados, finalmente, em 2009, 24 anos após sua publicação, a revista foi adaptada para o cinema, sob a batuta de Zack Snyder, que conseguiu uma transposição quase perfeita da obra de Moore e Gibbons.

Foto: Divulgação

Moore, na sua conhecida aversão a quase tudo, renegou a obra cinematográfica, inclusive abrindo mão de qualquer retorno financeiro, tudo para se manter coerente aos seus princípios. Sua crítica era que Watchmen (HQ) foi idealizada para a linguagem dos quadrinhos, sendo “inadaptável” para outras mídias.

A DC Comics – a editora que teve coragem de publicar uma obra tão inovadora – não se conformou em tão somente deter os direitos de personagens tão marcantes, dentro da estrutura de uma história fechada e, em 2012, chamou vários autores para lançar a questionável saga Before Watchmen (Antes de Watchmen), que revisita o universo criado por Alan Moore para ampliar a mitologia dos seus personagens. Apesar dos roteiristas terem buscado ao máximo serem fiéis ao espírito do bruxo inglês, nenhuma das histórias conseguiu, realmente, alcançar o mesmo nível do texto de Moore.

Mas o que a DC queria mesmo com isso era acostumar o público para novas inserções no mundo de Watchmen. Eis que surge, então, Doomsday Clok (ou o Relógio do Apocalipse), ainda não concluída, que traz o universo Watchmen para dentro do universo regular da DC, ou seja, Dr. Manhattan interagindo com Superman; um “novo” Rorschach caminhando lado a lado com Batman; Silk Spectre disputando beleza com Mulher-Maravilha etc. e tal.

Alguns membros da equipe Nerdtrip adoraram a ideia e a defendem com unhas e dentes, enquanto outros (como este colunista que lhes escreve) acham que tanto Before Watchmen (em menor grau), quanto Doomsday Clock são obras oportunistas e muito (mas muito!) aquém do que o material original (principalmente esta última).

Foto: Divulgação

E não se trata de purismo ou conservadorismo (como nossos colegas que defendem mais histórias com o universo Watchmen costumam nos acusar) mas de respeito a uma obra que, convenhamos, não demandava mais nenhum complemento. Certas obras possuem um princípio, meio e fim suficientes em si mesmas. Na minha ótica, as séries derivadas que a DC tem produzido a partir de Watchmen se assemelham a alguém escrever uma continuação para Hamlet, Dom Casmurro, criar duas novas estrofes para Starway To Heaven, ou acrescentar um detalhe novo no Mona Lisa.

Mas, eis que o produtor Damon Lindelof, conhecido por ser um dos criadores de Lost e da subestimada (mas muito bem avaliada) série The Leftovers (HBO), com uma ideia interessante: criar, para HBO, uma história que se passa no universo de Watchmen, respeitando o material dos quadrinhos (o filme mudou um elemento essencial da HQ), mas contando uma história original, que pode ou não envolver alguns dos personagens icônicos.

O primeiro dos nove episódios foi ao ar ontem, domingo, 20 de outubro de 2019.

O mundo de Watchmen não foi consumido por uma guerra nuclear, mas os EUA vivem numa enorme tensão interna, na qual há teorias da conspiração sobre o (falso) alien interdimensional (produzido por Ozymandias), que matou 3 milhões de pessoas em Nova Iorque (segundo a HQ); seguidas por (todo os EUA) de pancadas de chuvas de pequenas “lulas” (tipo “filhotes” do alien); policiais que precisam esconder o rosto e pedir autorização para sacar suas armas; grupos terroristas internos radicais (supremacia branca), que usam máscaras de Roschach (a Sétima Kavalaria, remetendo a uma nova Klu Klux Klan); um mundo em que celulares não foram inventados por medo da tecnologia, obrigando as pessoas a se utilizarem dos antigos bip’s; e uma polícia que conta com naves Archie’s para combater a criminalidade.

Foto: Divulgação

O primeiro episódio apresenta aquela que parece ser a protagonista da trama, a Sister Night / Det. Angela Abar (interpretada com vigor por Regina King), que seria uma espécie de super-heroína-funcionária-pública, contratada para auxiliar a polícia em casos especiais, ao mesmo tempo que é filha (muito provavelmente adotiva) do chefe de polícia Judd Crawford, interpretado por Don Johnson (excelente).

Neste primeiro episódio da série, a aura de mistério é constante, bem ao gosto das tramas concebidas por Lindelof, iniciando com a enigmática reconstrução do marcante episódio histórico dos EUA, conhecido como o massacre de Tulsa, no qual membros da KKK invadiram e destruíram o próspero bairro negro, causando a destruição de mais de 30 quarteirões pelo fogo e um número inexato de aproximadamente 300 negros (a estatística “oficial” seria de meros 39 negros, desconsiderando dezenas e dezenas de corpos carbonizados).

Esperar para ver qual a conexão que essa impactante cena inicial terá com o restante da trama.

Outro mistério envolve a figura de Jeremy Irons, no papel de um envelhecido Adrian Veidt (o Ozymandias), apesar de isso ainda não ter sido confirmado pela série, vivendo recluso num castelo na companhia de dois serviçais, cheio de manias esquisitas (como ser “lavado” pela empregada, nu, enquanto almoça sentado à mesa de jantar).

Foto: Divulgação

Há uma brevíssima imagem do Dr. Manhattan em Marte, o que, a princípio, distorce a informação que o personagem dá ao final do romance gráfico, de que estaria indo para outro universo “criar” alguns humanos e não retornar para o planeta vermelho.

Para os fãs da série, a quantidade de easter eggs é enorme e até difícil de acompanhar todos! Aparece o livro Sob A Máscara (escrito por Hollis Mason, o primeiro Nite Own), como fotos de personagens antigos, desenhos animados com os super-heróis daquele universo, referências a acontecimentos passados na HQ… um deleite!

Em termos de trama, este primeiro episódio entrega pouca coisa além das premissas já apresentadas, deixando ganchos e várias perguntas a serem respondidas no decorrer do programa, apesar do surpreendente final, com a morte de um dos personagens que mais chamaram a atenção neste primeiro capítulo.

A avaliação técnica é muito boa, seja na reconstrução de época, na concepção de mundo, com ótimos efeitos especiais digitais e práticos, bem como nas cenas de ação, bastante realistas (diferente das estilizadas cenas de luta do filme de 2009).

Os atores estão à vontade em seus papeis e entregues ao projeto (menção especial a Louis Gossett Jr. no papel do obscuro cadeirante de 105 anos de idade, Will Reeves). A montagem é dinâmica, mas sem ser apressada.

Foto: Divulgação

De modo que este primeiro episódio merece uma nota 3,5, de muito bom, pois apresenta um produto muito bem acabado, com reverência ao material de origem, mas, ao mesmo tempo, sem ser totalmente subserviente a ele.

Por mais que pessoalmente ainda me ressinta de ver o universo de Watchmen devassado por mãos menos brilhantes do que as de Alan Moore, a série consegue prender a atenção até mesmo dos não iniciados, cativando o público para sua história ainda bastante nebulosa, mas profundamente reverente ao que foi delineado na HQ.

A cada semana, postaremos alguns comentários sobre os episódios de Watchmen, a série, que, aliás, serão mais sucintos do que este, por não demandar mais nenhuma introdução.

Não percam, afinal: tic-tac, tic-tac

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Nota: 3,5 / 5 (muito bom)

Sou um quarentão apaixonado pela cultura pop em geral. Adoro quadrinhos, filmes, séries, bons livros e música de qualidade. Pai de um lindo casal de filhos e ainda encantado por minha esposa, com quem já vivo há 19 bons anos, trabalho como Oficial de Justiça do TJMG, num país ainda repleto de injustiças. E creio na educação e na cultura como "salvação" para nossa sociedade!!

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