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Críticas

DARK | Crítica do Neófito

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“Para nós, físicos presunçosos, passado, presente e futuro são apenas ilusões”

(Albert Eistein)

O tema do tempo – e, consequentemente, da possibilidade de se voltar nele ou pará-lo – sempre exerceu fascínio no ser humano.

Isaac Newton concebia essa variável da realidade como algo estático e contínuo, no qual o presente ocorre simultaneamente em todos os pontos do universo. Albert Eistein, todavia, com sua teoria da relatividade, mudou o entendimento acerca do tempo, que pode variar sensivelmente, a depender das distâncias e velocidades usadas como parâmetro de observação, sendo, como diz o nome de sua teoria, relativo. Assim, o que é presente para alguém parado na Terra, pode ser passado para alguém que se move à velocidade da luz. Com a incompreendida (e muitas vezes mal utilizada) Física Quântica, então, a coisa só complica!

Perguntas sobre o que se poderia ter feito diferente e como saber o que acontecerá são questões relevantes para a Filosofia e a Religião e até mesmo alguns segmentos isolados da Ciência, como demonstra o trabalho do cosmólogo brasileiro, Mário Novello, dedicado a estabelecer, ainda que em termos teóricos, a possibilidade da viagem no tempo, já que, em termos práticos, a Academia postula como inviável (impossível) tal acontecimento.

No terreno da ficção – no qual a mente humana só é limitada por sua própria criatividade – o ‘tempo’ começou a ser objeto de um sem número de obras, dos mais variados matizes e formatos a partir do pioneirismo de H. G. Wells e seu famoso romance A Máquina do Tempo, escrito em 1895, e que já mereceu duas adaptações hollywoodianas homônimas, em 1960 e 2002.

 Foto: Divulgação

De cabeça, além das obras mencionadas acima, pode-se citar diversas outras – quase todas enquadradas no gênero da ficção científica – que apresentam histórias sobre viagens no tempo nas mais diversas abordagens, como: a celebrada série dramática O Túnel do Tempo (1966-1967); a referencial saga de HQ dos X-Men, Dias de Um Futuro Esquecido (1981); os distópicos O Planeta dos Macacos (1968) e O Exterminador do Futuro (1985); a divertida e inesquecível aventura de De Volta Para o Futuro (1985); a fantasia romântico-redentora de Feitiço do Tempo (1993); o perturbador Donnie Darko (2001); o subestimado Antes que o dia Termine (2004); o incrivelmente pouco conhecido Primer (2004); o quase poético A Casa do Lago (2006); a longeva série Doctor Who (2005-2020); o bonito e sensível romance A Mulher do Viajante do Tempo (de Audrey Niffenegger), que virou o belo filme Te Amarei para Sempre (2009); o escatológico A Ressaca (2010 e a fraquinha sequência de 2015); o tenso e brilhante Contra o Tempo (2011); a ótima série de HQ da DC Comics, Flashpoint (2011); o muito bem executado e divertido filme nacional O Homem do Futuro (2011); o mediano e violento Looper: Assassinos do Futuro (2012); o lúdico e filosófico Questão de Tempo (2013); a ótima ficção No Limite do Amanhã (2014); o engraçado “terrir” A Morte Te Dá Parabéns 1 e 2 (2017, 2019); o maravilhoso anime Your Name (2017); o megassucesso Vingadores: Ultimato (2019), além de muitos outros que passaram despercebidos por este colunista (citem outras obras nos comentários!!!)

Foto: Divulgação

Unindo de forma brilhante várias dessas teorias e abordagens sobre viagem no tempo, sem perder de vista os questionamentos filosóficos que o tema suscita, e adotando um tom inicialmente muito mais próximo do terror, tem-se a brilhante e recém concluída série alemã Dark, distribuída mundialmente pela Netflix, que durou de 2017 a 2020, em 3 ótimas temporadas (a primeira com 10 episódios e as duas seguintes como 8).

Só de indispensavelmente mencionar que Dark lida com viagem temporal já representa um tremendo spoiler, de modo que aclarar qualquer outro elemento da trama pode estragar a experiência de assistir a esta série diferenciada do catálogo Netflix (o Nerdtrip fará outras matérias sobre a série, em que aspectos da trama serão abordados).

Sendo assim, o que se pode falar sem muito receio de entregar nada de relevante é que a série envolve a fictícia usina nuclear ao redor da qual gira toda a economia da interiorana cidade de Winden (que de fato existe e se situa numa das margens da mítica Floresta Negra), onde residem 4 famílias repletas de dramas, tragédias pessoais, crimes, traições conjugais, filhos adolescentes e pré-adolescentes em idade escolar e de descobertas afetivo-sexuais, das quais se destacam o protagonista Jonas (Louis Hofmann), filho do recém falecido Michael (Sebastian Rudolph) e de Hanna (Maja Schöne), que é amante de Ulrich (Oliver Masucci), o qual, junto com Katharina (Jördis Triebel), é pai da grande paixão de Jonas, Martha (Lisa Vicari), que também é irmã de Magnus (Moritz Jahn) e atual namorada do melhor amigo de Jonas, Bartosz (Paul Lux), por sua vez, filho de Regina (Deborah Kaufmann), que é filha da ex-presidente da usina nuclear Claudia (Julika Jenkins) – e portanto neta materna ex-policial Egon (Christian Pätzold) – e casada com o atual presidente da companhia, Aleksander Tiedemann (Peter Benedict). Ainda se tem a policial Charlotte (Karoline Eichhorn), mãe de Franziska Doppler (Gina Alice Stiebitz) – namorada de Magnus – e da deficiente auditiva Elisabeth Doppler (Carlotta Von Falkenhayn), além de casada com o terapeuta Peter (Stephan Kampwirth), que é filho de Helge (Hermann Beyer), por sua vez filho do fundador da usina nuclear e por aí vai, com vários personagens misteriosos sendo introduzidos aos poucos! Só essa pequena descrição já dá nó na cabeça, não?

Foto: Divulgação

Pois saiba, tripulante, que isso é, como dizem os próprios personagens da série, apenas o conhecimento de uma “gota no oceano” da história! A cada episódio, a trama se desenvolve e evolui a partir das relações desses personagens num nível angustiante sempre crescente, como se o espectador fosse jogado num labirinto cada vez mais fundo (não à toa, o mito de Ariadne – que ajudou Teseu a sair do labirinto do Minotauro – é recorrentemente referenciado ao longo da série). São muitos mistérios, que, ao serem “resolvidos”, só lançam o público em mais desdobramentos imprevisíveis.

Foto: Divulgação

O tom dos primeiros episódios, como mencionado, é claramente de horror, inclusive com alguns exageros sonoros para provocar tensão e medo a quem assiste à série, e pela fotografia sempre acinzentada, ressaltando a sensação de isolamento, frio e melancolia; mas aqueles que chegarem ao terceiro episódio da temporada inicial serão premiados com as primeiras respostas, que, em verdade, implicam em mais perguntas. O clima de terror vai cedendo lugar ao de crescente suspense, graças ao roteiro extremamente intricado e bem amarrado, aos personagens cativantes, muito bem trabalhados e realistas – todos com virtudes e falhas de caráter –, e à direção segura de Baran bo Odar (também criador e roteirista). Só mais uma revelação: não há heróis ou vilões em Dark!!!! Só pessoas jogadas de cá para lá pelo destino!!!

Incrível perceber como os criadores (Baran bo Odar e Jantje Friese) tinham o total controle de sua narrativa nas mãos, não deixando nenhuma importante ponta solta. As poucas questões não respondidas não fazem falta alguma, na verdade.

Foto: Divulgação

Servindo como lição aos enlatados norte-americanos, Dark claramente quer contar uma história e faturar alguma coisa relevante em consequência de uma boa trama, enquanto que, nos EUA, fica claro que, em muitas oportunidades, o que se quer é faturar o máximo possível sobre enredos que, não poucas vezes, de uma premissa interessante, perdem-se em tantos desdobramentos (e “espichamentos”), que quase não permitem mais uma resolução satisfatória, sendo Lost o grande exemplo disso.

Dark poderia facilmente se estender por 3 ou mais temporadas, mas sabiamente entendeu que, caso cedesse à tal tentação, correria o risco de – olha o déjà vu! – tornar-se repetitiva, perder grande parte do seu apelo de suspense cada vez maior (principalmente nas duas primeiras temporadas) e não conseguir fechar seus arcos de forma tão competente como o fez.

Foto: Divulgação

Ao contrário da já mencionada Lost e, claro, Game Of Thrones – cujos finais foram, no mínimo, decepcionantes, para não dizer completamente indignos da série – Dark oferece um fechamento totalmente coerente com seu início e desenvolvimento. Alguns podem até achar que a resolução (ou não) da história pode ter se dado de maneira muito rápida, quase óbvia e mágica, mas é preciso prestar a atenção nas falas dos personagens mais relevantes para perceber que, apesar da série alemã só ter mostrado ‘um’ dos terríveis ciclos que envolvem todos aqueles trágicos personagens, isso já vinha se desenrolando milhares de vezes, num desgastante loop sem fim!

Dark aborda o conceito de viagens temporais de forma séria. Não é nada divertido ver o que se pode ocorrer quando alguém brinca com sua própria história passada, com a de outro alguém ou tem vislumbres do que a pessoa se tornará. Desse modo, mais uma vez ao contrário das produções seriadas da tv norte-americana, o programa alemão abre espaço para certos questionamentos de ordem filosófico-teológica sobre o livre-arbítrio, determinismo, destino e o poder do amor, mas nunca de forma óbvia ou clichê. As múltiplas referências nos nomes dos personagens, nos cartazes que os jovens têm pregado em seus quartos, nos livros lidos, nas personalidades citadas é outro elemento que denota o esmero da produção, tanto em termos estéticos, quanto no tocante às reflexões decorrentes de uma real possibilidade de se viajar no tempo.

Foto: Divulgação

Em termos negativos, pode-se citar a total falta de representatividade racial na série. Não há um negro sequer, por mais que sociologicamente isso represente um fato observável na sociedade alemã. Para uma trama que envolve viagem temporal, incrível não haver uma mençãozinha sequer sobre a Alemanha nazista, o que só prova o quanto esta ferida ainda dói na pele aloirada dos alemães. Por fim, apesar da boa cenografia, figurino e bons efeitos visuais para a retratação da usina, das cavernas e das variações temporais, os efeitos especiais propriamente ditos – e quando necessários – ficam um pouco a dever, principalmente na terceira temporada, quando a série já era um sucesso e poderia, em tese, contar com melhor aporte financeiro.

Mas, em termos de produto final, Dark se mostra como um produto cultural-midiático realmente único e diferenciado, que merece ser apreciado sem moderação.

Se você gosta do tema de viagem no tempo, Dark é obrigatória!

Permita-se, assim, assustar-se, angustiar-se, surpreender-se e torcer pelos trágicos habitantes de Winden, ainda que a vida pareça muito cruel às vezes e as escolhas sempre impliquem em algum sacrifício!

Foto: Divulgação

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Nota: 4,5 / 5 (excelente)

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Sou um quarentão apaixonado pela cultura pop em geral. Adoro quadrinhos, filmes, séries, bons livros e música de qualidade. Pai de um lindo casal de filhos e ainda encantado por minha esposa, com quem já vivo há 19 bons anos, trabalho como Oficial de Justiça do TJMG, num país ainda repleto de injustiças. E creio na educação e na cultura como "salvação" para nossa sociedade!!

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