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Críticas

GARRA DE FERRO – Quando a realidade é mais criativa que a ficção | Crítica do Neófito

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O que Joe Jackson, Mathew Knowles, Richard Williams e Fritz Von Erich (ou Jack Adkisson) têm em comum?

Todos são pais-empresários de sucesso, os quais transformaram seus filhos em verdadeiros produtos da cultura pop, mesmo que, em alguns dos casos, o preço a pagar fosse a própria saúde mental e emocional de sua prole.

Joe Jackson é pai e empresário dos integrantes do famoso grupo setentista The Jackson 5, do qual, evidentemente, destaca-se o “rei do pop”, Michael Jackson, que nunca escondeu sua mágoa do pai, por tê-lo privado de ter uma “infância normal”, gerando nele uma série de desajustes socioemocionais.

Mathew Knowles é o pai da “Queen Bey” Beyoncé, tendo sido o empresário linha-dura do grupo que lançou sua filha no mundo da música, as Destiny’s Child e, depois, tornou a filha a mais bem-sucedida artista pop de sua época.

Richard Williams – que já teve até uma cinebiografia estrelada por Will Smith (King Richard: Criando Campeãs, de 2021) – é o determinado e obsessivo pai das campeãs absolutas do tênis feminino, Venus e Serena Williams.

Por fim, Fritz Von Erich (nome/pseudônimo assumido por Jack Adkisson) foi, além de estrela do Wrestling norte-americano (luta-livre) na década de 1970, conhecido por usar da antipatia do público com relação ao seu alterego pseudonazista para se firmar com grande lutador do ramo, colocou, graças à sua obsessão em trazer para a família o cinturão de campeão mundial de Wrestling, seus quatro filhos – Kevin, David, Kerry e Mike Von Erich – no hall da fama da luta-livre durante a década de 1980.

De todos esses pais-empresários, capazes de colocarem a carreira, o trabalho e o projeto de fama acima do próprio afeto paternal, mas que, de fato, fizeram história, Fritz Von Erich é, com certeza, aquele menos conhecido do grande público – a não ser dos fãs do Wrestling – e o que traz consigo a mais pesada bagagem de tragédias familiares, ao ponto de sua família ter ganhado a alcunha de “cursed” (amaldiçoada).

Foto: Divulgação (a realidade e a ficção)

Não vamos contar tais tragédias aqui – apesar de serem de domínio público e facilmente acessadas no Google – por representarem spoilers deste incrível filme Garra de Ferro (Iron Claw), dirigido com impressionante segurança por Sean Durkin (série Gêmeas: Mórbida Semelhança) e estrelado por um admiravelmente ótimo Zac Efron (como Kevin Von Erich), além de Harris Dickinson (David Von Erich), Jeremy Allen White (Kerry Von Erich), Stanley Simons (Mike Von Erich), Holt McCallany (Fritz Von Erich), Maura Tierney (Doris Von Erich) e Lily James (Pamela J. May, ou, simplesmente, Pam).

O fato de a história ser real é realmente impressionante. Com tantas tragédias a serem mostradas, Durkin poderia, facilmente, descambar seu filme para o melodrama, típico dos telefilmes cinebiográficos que assolavam as telinhas domésticas nos tempos da clássica tv aberta e antes das tvs a cabo e da era pré-streaming. Contudo, ao contrário, o cineasta conseguiu produzir um filme ímpar, capaz de envolver o espectador no drama daquela família marcada por tantos acontecimentos infelizes, mas unida por verdadeiro amor fraternal e dedicação à luta-livre, esporte muitas vezes incompreendido e tido como mera teatralização (e, com Garra de Ferro, a sétima arte passa a contar com duas ótimas produções cinematográficas que giram em torno do Wrestling, ao se unir ao ótimo O Lutador, de 2008, estrelado por Mike Rourke).

A reprodução das lutas é impecável (levadas a efeito pelos próprios atores nas maiorias das vezes), funcionando organicamente dentro da proposta narrativa, isto é, nem sendo extensas o suficiente para ofuscar a história de vida dos personagens, nem rápidas demais a ponto de não passarem a ideia de entretenimento que o esporte retratado representava para a cultura estadunidense.

Foto: Divulgação (o salto de um “astro” para se tornar “ator”)

A fotografia é bela e melancólica; a cenografia é acertada; os figurinos corretos; a trilha sonora é bem empregada; reconstrução de época convincente; o roteiro é redondinho; e as atuações estão acima da média.

Aliás, o elenco todo está impecável, entregando-se verdadeiramente a seus papeis, talvez entendendo a dimensão da obra em que estavam inseridos. Mas Zac Efron se destaca, não apenas por seu protagonismo, mas pela carga dramática, eivada de sutilezas, que o galãzinho de ex-High School Musical deixa transparecer por debaixo de seu físico assustadoramente grande, forjado especialmente para o filme. O amadurecimento artístico do ator é digno de aplausos.

A história é um retrato cruel e realista da cultura norte-americana, principalmente da sulista e daquela ideia do self made man. Logo no primeiro ato do filme, a câmera passeia pela estante de armas, pelos troféus e medalhas e pelos retratos da família (sempre tendo o patriarca ao centro), indicando o quanto a competição (no esporte e entre si) iria marcar aquelas pessoas, sempre em torno dos sonhos do pai, que não tinha nenhum pudor em classificar sua preferência por cada filho.

O universo masculinizado, machista e misógino também fica transparente, principalmente quando a mãe (Maura Tierney) se omitia diante das pressões do pai sobre os filhos, escondendo-se na religião (armas, meritocracia, religião e valores familiares patriarcais… isso não lembra alguma coisa?).

O fato é que a luta-livre, ao mesmo tempo que trouxe objetivo para a vida dos irmãos Von Erich, tirou deles o sentido de viver, afinal, até que ponto o sonho do título mundial era realmente deles ou apenas a projeção das frustrações do pai?

O roteiro não é perfeito, afinal, com tanta coisa para contar, alguns aspectos acabariam, de fato, sendo trabalhados com menos profundidade, como no caso da trajetória do irmão mais novo, Mike, cujo desenvolvimento é menos convincente do que os dos demais. As personagens femininas também são pouco aprofundadas, apesar das atuações irrepreensíveis de Lily James e da já citada Maura Tierney.

Ao fim, Garra de Ferro apresenta uma história incrivelmente real, quase difícil de acreditar se não fosse tão conhecida e documentada, que envolve, encanta, surpreende, choca e algumas vezes emociona.

Uma ótima pedida mais madura e sóbria nestes tempos de tantos universos compartilhados, de tão pouca criatividade e de tanta reciclagem de histórias e temas do cinemão hollywoodiano e seus derivados.

Foto: Divulgação (unidos por imenso amor e tamanha dor…)


Nota: 4 / 5 (ótimo)

 

 


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Sou um quarentão apaixonado pela cultura pop em geral. Adoro quadrinhos, filmes, séries, bons livros e música de qualidade. Pai de um lindo casal de filhos e ainda encantado por minha esposa, com quem já vivo há 19 bons anos, trabalho como Oficial de Justiça do TJMG, num país ainda repleto de injustiças. E creio na educação e na cultura como "salvação" para nossa sociedade!!

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