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Críticas

MISS MARVEL | A Série “algodão doce” do UCM! – Crítica do Neófito (com pequenos SPOILERS)

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A famosa sexóloga Esther Perel costuma defender que o relacionamento afetivo-conjugal completamente estável é inimigo do desejo, o qual, para se manter vivo, precisaria de alguma dose de incerteza.

No campo do Direito, é lugar comum a incompatibilidade entre liberdade e segurança, proporcionalmente excludentes entre si.

Já na seara do entretenimento, a máxima é que quanto mais quantidade, pior a qualidade.

Eis, exatamente, o que parece estar ocorrendo com o Universo Cinematográfico Marvel (UCM) nesta sua autodenominada 4ª Fase, agora totalmente sob controle da poderosa Disney.

Foto: Divulgação (quase tudo o que saiu no cinema nas primeiras três fases do UCM)

Sendo muito sincero, à exceção de Homem-Aranha: Sem Volta pra Casa (2021) e What If…? (2021), produções que entregaram praticamente tudo o que se poderia esperar delas, as demais obras dessa fase – Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis; Eternos; Doutor Estranho no Multiverso da Loucura; WandaVision; Falcão e o Soldado Invernal; Loki; Gavião Arqueiro; Cavaleiro da Lua – sempre ficaram devendo “alguma coisa”.

WandaVision, por exemplo, gerou um engajamento monstro em torno do que poderia vir a acontecer, com teorias sobre a aparição do Dr. Estranho, do vilão ser o demônio Mefisto e, principalmente, sobre a introdução dos X-Men, a partir da confirmação de que o ator Evan Peters – o mutante Mercúrio das produções Marvel a cargo da Fox (X-Men: Dias de Um Futuro Esquecido, de 2014; X-Men: Apocalipse, de 2016) – interpretaria o Mercúrio de Vingadores: Era de Ultron (2015). Tudo, porém, ficou apenas no campo da frustração, tipo “Pegadinha do Malandro”, uma vez que a Disney surfou na onda da boataria para chipar seu programa ao máximo, mas entregando o mínimo (desconsiderando, nesta análise, a qualidade intrínseca da série, que realmente inovou em termos de proposta estética, na interpretação dos atores e no cuidado técnico da produção, apesar do auge da pandemia de Covid).

Foto: Divulgação (juro que gostaria de estar superempolgado, mas…)

Mas após a estupenda década de produções com nível sempre variando entre o bom e o ótimo (de Homem de Ferro, 2008; a Vingadores: Ultimato, 2019), as expectativas sobre a continuidade do UCM eram enormes; afinal, o que Kevin Feige estaria tramando para o próximo arco de dez anos da Marvel, agora, não apenas no cinema, mas em todo o espectro audiovisual?

Como dito acima, até agora não muita coisa.

A “fórmula” UCM ficou tremendamente explicitada com as produções citadas nos parágrafos anteriores: clima inicial de tensão e mistério, introdução dos personagens, alívios cômicos, violência comedida, resoluções fáceis. Por mais que Eternos tenha tido um pouco mais de personalidade, graças ao comando da fantástica Chloé Zhao, não dá para deixar de perceber que o roteiro era profundamente esquemático, fechado e aprisionado a uma estrutura pré-estabelecida.

Aliás, nesta nova fase do UCM, a única coisa que a Disney tem tentado fazer para parecer estar mudando alguma coisa nas suas produções é convidar e dar mais liberdade para os diretores escalados ou, então, optar por formatos específicos, especialmente nas suas séries televisivas. Desse modo – novamente à exceção de WandaVision, que teve proposta estética absolutamente inovadora – Loki parece ter se embebido do modelo de Além da Imaginação com Perdidos no Espaço, isto é, nas séries antigas de ficção e realidade fantástica da década de 1970; Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis claramente se inspirou no universo dos animes (principalmente Dragon Ball); Dr. Estranho no Multiverso da Loucura, a cargo do veterano Sam Raimi, flertou com o terror, mas ‘beeeeem’ de leve, reconheçamos; assim como Cavaleiro da Lua; e, mais recentemente, temos Miss Marvel, que não teve o menor pudor em se basear na estética de séries teens, tais como Todo Mundo Odeia o Chris e Anos Incríveis.

Foto: Divulgação (Oba!… será?)

O problema, também, é que o público espera que cada nova produção do UCM represente um novo tijolinho na construção de uma grande saga de fundo, como ocorreu com o evento Vingadores: Guerra Infinita e Vingadores: Ultimato. Mas, até o momento, apesar da introdução do multiverso, todas as produções mencionadas desta Fase 4 parecem até mesmo desconectadas do todo do UCM e seus acontecimentos anteriores. Cavaleiro da Lua, então, não faz a mínima menção aos eventos ocorridos em Guerra Infinita, como o “blip” que desapareceu com metade da vida da Terra. Aliás, depois de Falcão e Soldado Invernal, qualquer menção aos eventos ou aos possíveis desdobramentos político-sociais e econômicos de um acontecimento tão traumático – o súbito sumiço e reaparecimento, num hiato de cinco anos, de metade das pessoas e seres vivos do planeta – parece ter sido retirado das produções audiovisuais da Marvel-Disney, tornando tudo muito mais fantasioso e pouco impactante.

Anúncios de novos personagens – Namor, Dr. Destino, Sr. Fantástico, Inumanos, X-Men, Deadpool etc. – começam a não mais empolgar crítica e fãs, que já demonstram menos boa vontade para com as produções Marvel. Afinal, para onde tudo isso está levando?

O que nos traz voltar para Miss Marvel, produção simpática e, como ficou conhecida na crítica especializada, a mais “fofa” do UCM.

A personagem em si é muito boa e faz enorme sucesso nas HQs, por fugir do estereótipo clássico: Kamala Khan, a Miss Marvel, é uma adolescente mulçumana, fã da Capitã Marvel, e que ganha poderes Inumanos (nem mutantes, nem cósmicos), de poder alterar a sua massa física. Seu apelo junto ao público jovem foi enorme e muito satisfatório para a Marvel atrair nova gama de leitores para suas produções quadrinísticas, onde, evidentemente, ela está condenada a uma adolescência eterna (assim como Peter Parker, mesmo sendo um gênio científico, à pindaíba inacabável e o Quarteto Fantástico a um interminável relacionamento familiar tóxico); algo que fatalmente levará à repetição de temas e enredos ao longo dos tempos; mas ainda assim, Miss Marvel representa um respiro de novidade dentro do rígido universo das HQs mainstream.

Foto: Divulgação (Marvel® – heroína porreta, que veio para ficar! Insha’Allah!)

Em sua versão live-action, o UCM teve a felicidade de encontrar a extraordinária Iman Vellani para dar corpo à carismática personagem que, diga-se de passagem, é a melhor coisa de toda a série. A simpatia e espontânea caracterização da jovem atriz compensa o roteiro frágil, muitas vezes incoerente e pouco inspirado; além da troca inesperada de conteúdo da personagem, a qual adquire poderes bastante diversos da sua contraparte em HQ, isto é, ao invés de afetada pelo terrígeno Inumano, alcança poderes cósmicos misturados com genética mutante diferenciada, alienígena ou transdimensional.

Foto: Divulgação (já sua contraparte em live-action…)

Muito se tentou explicar sobre esse novo formato dos poderes de Kamala, excessivamente parecida ao personagem Quasar dos quadrinhos, capaz, ao contrário da alteração de sua massa física, de gerar luz sólida por meio de seus braceletes quânticos (referência, também, ao antigo Capitão Marvel – ou Mar-Vell – colocando-a de vez no rol dos personagens cósmicos e/ou alienígenas). Tudo com o objetivo de a aproximar mais da Capitã Marvel e da Mônica Rambeau para o filme The Marvels, previsto para 2023 (aliás, a cena pós-crédito do último capítulo da série explicita a tese). Contudo, nenhuma explicação foi muito convincente. Ao que parece, o verdadeiro motivo das alterações foi não precisar reintroduzir os (fracassados em péssima série) Inumanos no UCM, mesmo após a já sabida aparição de Raio Negro (Anson Mount) em Dr. Estranho no Multiverso da Loucura.

Abstração feita a esse “detalhe” da série, e de sua explícita caracterização teenager (muito menos realista que Stranger Things, por exemplo, para ficar no mesmo campo temático jovial-fantástico), Miss Marvel apresenta o interessante mundo mulçumano a coexistir no seio da periferia de Nova Jersey, com alguns detalhes daquela rica e incompreendida cultura; todavia, sua retratação não foge ao certo olhar preconceituoso e inferiorizante, no tocante às virtudes do American Way Of Life e toda sua decantada liberdade. Não à toa, Yusuf e Muneeba Khan (respectivamente os atores Mohan Kapoor e Zenobia Shroff), pais de Kamala, em determinado ponto, dizem mais ou menos que “vieram para a América para terem liberdade de fazer as coisas como eles queriam”. Por mais que se trate de roteiro escrito por mentes norte-americanas, louvando sua cultura e país, não há como não sentir certo cheiro de xenofobia nessa frase, não é mesmo?

Mas o que realmente incomoda na série é a fragilidade do roteiro e da concepção dos personagens, principalmente da dos vilões – os Djinn’s – claramente os mais bipolares e desastrados que já surgiram no UCM. Nos quadrinhos, essa “raça” seria filha-herdeira de Lilith, personagem mais ligada ao universo místico da Marvel Comics (Dr. Estranho, Mefisto, Motoqueiro Fantasma), ou ao Thor (já que viveram e morreram em Asgard). No live-action são transdimensionais, oriundos da tal inédita Dimensão Noor e muito incoerentes: salvam Kamala discretamente, para depois quererem matar todos os familiares dela numa festa de casamento; são superpoderosos e capazes de fugir da cadeia especial feita para prender pessoas com poderes, mas são facilmente capturados pela United States Department of Damage Control (a Damage Control ou DODC), que é outra inexplicável ameaça à Kamala, atirando em jovens dentro de uma escola. A líder dos Djinn’sNajma (vivida por Nimra Bucha) – é um poço de dupla personalidade, sendo amorosa com Kamala e o filho Kamran (Rish Shah), para logo em seguida tentar matar uma e abandonar o outro, e depois se sacrificar por ele!

Foto: Divulgação (taí uma vilã que precisa urgentemente de uma psicoterapia)

São tantos furos no roteiro que parece que estamos assistindo a um programa estilo “pano multiuso”!

Isso sem falar no clima bobinho e açucarado, mesmo na bela cena do penúltimo capítulo, que reproduz com boa fidelidade a Partilha da Índia (Partition), evento histórico que de fato ocorreu, em 1947, no processo da independência indiana do Reino Unido e no qual o país foi dividido em dois com base na religião (hindus ficando na Índia; Mulçumanos no Paquistão). Apesar de visualmente impactante, a cena ameniza sobremaneira os trágicos eventos dessa decisão burocrática de divisão do país por critérios religiosos, os quais reverberam até hoje na profunda animosidade existente entre os mencionados países. Kamala anda “tranquilamente” por entre os milhões de pessoas que trocavam de país na apertada estação de trem quando, na realidade, a história verdadeira conta o número absurdo de mulheres abusadas e mortas nesse processo.

Foto: Divulgação (Brie Larson garantindo o lanche da tarde)

O “padrão Disney” parece ter definitivamente se incorporado ao UCM, tornando- muito mais asséptico e seguro para ser consumido por toda a família. O sangue é sempre mínimo e a violência nunca beira ao gráfico. Em Miss Marvel, então, ninguém se fere de fato. O perigo parece genérico e mínimo. Nunca tememos, de fato, pelo destino do personagem.

Ao fim, a série é, realmente, “fofa”, um delicioso algodão doce que, tão logo entra na boca deixando seu sabor, desfaz-se, levando consigo sua doçura.

E é só!

Pode até ter feito sucesso junto ao público jovem e ter correlação com outras produções futuras, mas, realmente, é a produção menos caprichada do UCM até o momento (Mulher-Hulk e seu CGI “The Sims” tem forte potencial para superar a ruindade de Miss Marvel!).

Salva-se alguma coisa, como já dito, em Iman Vellani, mas que a Marvel e a Disney entendam rápido que essa leva absurda de produções só vai fazer com que, cada vez mais e mais, a qualidade delas venha a despencar.

Ou se desmanchar como algodão-doce…

Foto: Divulgação (às vezes é melhor olhar o céu do que ver qualquer série…)


Nota: 2,5 / 5 (regular)

 


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Sou um quarentão apaixonado pela cultura pop em geral. Adoro quadrinhos, filmes, séries, bons livros e música de qualidade. Pai de um lindo casal de filhos e ainda encantado por minha esposa, com quem já vivo há 19 bons anos, trabalho como Oficial de Justiça do TJMG, num país ainda repleto de injustiças. E creio na educação e na cultura como "salvação" para nossa sociedade!!

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