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Críticas

OPPENHEIMER | Crítica do Neófito

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Dá para imaginar as discussões de Christopher Nolan e toda a equipe criativa em torno de como fariam de Oppenheimer um filme que fosse minimamente interessante para justificar suas 3 horas de duração, já que, diferentemente das obras pelas quais o diretor ficou conhecido, tratava-se de uma história real, amplamente conhecida pelo público, portanto, sem pirotecnias de roteiro (como em Tenet ou Amnésia); desprovido de cenas ação (como Batman e A Origem); sem tomadas e sequências grandiosas (como em Durkink) e cujo final é simples e trivial.

A decisão deve ter ficado em torno de: “vamos chamar o maior número de estrelas hollywoodianas que pudermos (sem esquecer dos atores favoritos de Nolan – claro! – como Cillian Murphy e Matthew Modine), mesmo que para papéis pequenos ou ‘pontas’ (como no caso de Rami Malek); optar por muitos cortes rápidos, mesmo que 99% das cenas sejam de diálogos, para dar a sensação constante de urgência e tensão; misturar um pouco – mas nem tanto – a ordem cronológica da história, entrecortando cenas de passado mais remoto com outras menos tardias, usando o preto e branco para diferenciá-las, só para manter a assinatura do cineasta; usar efeitos práticos para a cena de explosão atômica, para atrair a curiosidade do público”!

Faz-se esse exercício de imaginação, pois, foi exatamente isso que se vê em Oppenheimer, a grande aposta para o Oscar até agora, muito hypado e incensado, mesmo antes de ser lançado.

Daí que qualquer comentário acerca de um filme dessa magnitude deve ser feito com bastante cuidado.

Quando se procede à análise de filmes, pode-se utilizar, na verdade, dois critérios de forma independente ou associados: pode-se, por exemplo, recorrer-se a uma série de critérios técnicos, como edição, montagem, cenografia, fotografia, roteiro, ângulos de câmera etc., destrinchando cada detalhe e aspecto para se chegar à conclusão de que o longa possui mais qualidades do que defeitos. Por outro lado, pode-se apenas se permitir levar pelo que se vê na tela e deixar o estômago dar o veredito. Se o filme emocionou, empolgou e fez vibrar na cadeira, trata-se de uma boa produção.

Essa régua não é exata, claro. Na medida em que assistimos a mais filmes, mais exigentes e atentos para detalhes técnicos ficamos, o que não impede de continuarmos nos emocionando de verdade com a mágica da tela grande. Quando o filme consegue unir essas duas coisas, tem-se uma obra-prima, ou algo muito próximo disso.

Oppenheimer é um filme que fica no meio-termo: é impecável do ponto de vista técnico: cenografia belíssima, reconstituição de época irretocável, maquiagem fabulosa, efeitos visuais inquestionáveis, montagem dinâmica e correta, roteiro bem escrito e amarrado, atuações magníficas, fotografia deslumbrante, direção segura etc. e tal. Outro ponto positivo é que suas três horas de duração não pesam. E, como a cereja do bolo, apesar de tantas estrelas e ambições da produção, não foi um filme caro para os padrões hollywoodianos de blockbusters, custando pouco mais de 100 milhões de dólares.

Em contrapartida, não se trata de um filme empolgante, daqueles que se sai do cinema com uma vontade louca de comentar e recomendar com e para todos. No entanto, ainda assim, é daquelas obras que, se perguntarem a você se deve ser vista no cinema, muito provavelmente se dirá que “sim, claro!”.

A história tem um ótimo apelo, afinal, conta-se a nada medíocre vida e obra daquele que é considerado o “pai da bomba-atômica”Robert Oppenheimer – responsável por sua pioneira fabricação e subsequente aplicação sobre as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki, num espaço de menos de um mês; e, posteriormente, um sujeito caçado pelo marcathismo, numa suposta trama de vingança (da parte de seu invejoso desafeto Lewis Strauss, vivido magistralmente por Robert Downey Jr.) e emudecimento (por parte do governo que ajudou a vencer a guerra, graças à sua assumida posição contrária à corrida armamentista).

Contudo, por mais que se trate de um personagem histórico cuja obra, como Jesus Cristo, também dividiu a história (em “antes da bomba” e “depois da bomba”, como Oppenheimer mesmo destaca numa entrevista ao vivo facilmente encontrada na internet, na qual cita a passagem “agora eu me tornei a Morte, a destruidora de mundos”, do texto sagrado hindu Bhagavad-Gita, para descrever o mundo pós explosão nuclear), de ser um gênio ímpar (capaz de aprender holandês em seis semanas para proferir um palestra sobre mecânica quântica na língua natal de seus anfitriões), não há como negar que, em termos de personalidade, Oppenheimer foi um homem comum, cheio das falhas típicas de seu tempo e temperamento, sem grande destaque no âmbito pessoal (apesar das amantes que colecionou, tais como qualquer homem influente de sua época), quando se comparado a um Walt Disney, por exemplo.

Sabedor disso, Nolan baseia seu filme na famosa biografia do físico, American Prometheus, escrita por Kai Bird e Martin J. Sherwinus, conhecida por sua abordagem dinâmica e parcial a respeito de seu biografado. A partir disso, o roteiro estabelece metáforas entre o caso amoroso de Oppenheimer e a controversa psiquiatra e comunista Jean Tatlock (interpretada com completa entrega por Florence Pugh) – que supostamente se suicidou – e sua visão de mundo após a bomba, que causou seu “suicídio político”, supostamente se entregando sem resistência ao massacre público de que foi alvo, pela culpa de haver criado o mecanismo de destruição em massa, que pode acabar com a humanidade. Aliás, a respeito de Pugh e sua comentada cena de nudez, pode-se dizer que a fabulosa atriz a tira de letra – já que é conhecida por defender a naturalização do corpo feminino – em sequências desprovidas de sensualidade, que, em verdade, buscam trazer muito mais camadas de simbolismo para o ato.

Foto: Divulgação (explodindo a história)

Já o casamento de Oppenheimer com Kitty (no corpo e talento de Emily Blunt) quase não tem grande serventia para a narrativa, a não ser pela personalidade forte e polêmica desta última, que permanece com o marido (às vezes frio e infiel) até o fim, ainda que claramente ressentida com o papel social reservado às mulheres de seu tempo. De modo que o filme aborda muitas questões, mas não se aprofunda muito em nenhuma. Pelo que foi dito, percebe-se que, diante da falta de plot twists, Nolan prefere focar no estudo de personagens que, sem dúvida, é o maior acerto do filme, enquanto questões mais espinhosas são tratadas de forma contida.

O conflito ideológico a respeito da bomba de hidrogênio de Oppenheimer com o governo estadunidense, por exemplo, é tratado com ambiguidade, nunca assumindo o tom de crítica contundente (apesar da cena sobre a discussão de quando e onde lançar a bomba sobre o Japão e da última tomada do longa, bastante impactante). Mostra-se a autoindulgência e imolação do físico a partir da injustiça de seu “julgamento”, como se carregasse e assumisse apenas para si a responsabilidade da criação de um artefato capaz de mudar para sempre o cenário geopolítico, minimizando sua utilização suicida pelos governos – começando pelo dos EUA. O título de verdadeiro vilão da história é jogado nas costas de Lewis Strauss, na atuação magnetizante de Robert. Downey Jr., como se fosse ele – e não o governo – o responsável pela derrocada pública de Oppenheimer. Culpam-se pessoas e não instituições.

A atuação de Cillian Murphy é assustadora de tão boa. O ator – conhecido por dar vida a outro personagem real, o gangster Tommy Shelby, da série Peaky Blinders – é, realmente, um dos grandes de sua geração. Se ele e Downey Jr. não receberem indicação ao Oscar por suas atuações em Oppenheimer, há algo de errado no Reino da Dinamarca!

Por último, há que se falar da esperada recriação cinematográfica da cena de explosão da bomba atômica no dia da Experiência Trinity, em 16 de julho de 1945, anunciada como feita sem utilização de computação gráfica e que deveria ser o ponto alto do filme. É um cena muito bem-feita, carregada – por Nolan – de simbolismos e significados (como em várias outras partes do filme), mas já esperada e historicamente conhecida. E é só!

Enfim, Oppenheimer é uma obra grande e ambiciosa, feita com muito esmero e cuidado, que conta uma história da História humana, pelo ponto de vista do homem que lhe foi o pivô. Mas ao contrário daquilo que conta, não se firmará como aquela explosão nuclear capaz de dividir a história do cinema em antes e depois dela.

Foto: Divulgação (a expressão de Prometeu após abrir a Caixa de Pandora!)

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Nota: 4 / 5 (ótimo)


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Sou um quarentão apaixonado pela cultura pop em geral. Adoro quadrinhos, filmes, séries, bons livros e música de qualidade. Pai de um lindo casal de filhos e ainda encantado por minha esposa, com quem já vivo há 19 bons anos, trabalho como Oficial de Justiça do TJMG, num país ainda repleto de injustiças. E creio na educação e na cultura como "salvação" para nossa sociedade!!

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