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FISHBOWL WIVES S01 – O estranho erotismo nipônico | Escondido na Netflix (Crítica do Neófito)

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Enquanto em Minas Gerais – de onde escrevo estas linhas – você pode ser convidado a comer uma deliciosa porção de mandioca, no Rio de Janeiro seria o caso de uma porção de aipim, enquanto, no Nordeste, o convite seria para beliscar algumas macaxeiras.

Trata-se, porém, da mesma iguaria, denominada diferentemente, de acordo com a região em que é preparada.

Do mesmo modo, enquanto em Minas o carro para no “sinal” vermelho, em São Paulo seria no “farol”.

Foto: Servido?

São diferenças culturais substantivas existentes entre estados federativos de um mesmo país, inclusive fronteiriços.

Todavia, quanto mais longe se vai, mais diferenças socioculturais se imporão de forma contrastante entre os povos e raças, isso sem contar a dificuldade de comunicação em razão do idioma diverso, do clima, dos costumes e da história particular de cada nação (a produção nacional, Cine Holliúdy, por exemplo, filmada no Ceará, teve a genial sacada de colocar legendas de Português “normal” no filme, para que o espectador do Sudeste e Sul conseguisse entender o dialeto, sotaques e expressões idiomáticas do Nordeste).

Foto: Divulgação

Exatamente no oposto do planeta, a doze horas de distância do Brasil, a ilha que serve de território para o Japão representa não apenas um país diferente, mas um universo cultural absolutamente diverso da atmosfera tropical e solar dos brasileiros.

A rigidez de costumes, a disciplina impressionante, o código de honra extremado, a timidez natural, entre outras características dos japoneses costumam causar estranheza aos sanguíneos latinos e sua habitual efusividade. Se um político ou empresário do Japão são pegos em esquemas de corrupção ou crimes, não é incomum que se suicidem diante das câmeras ou do público, herança do antigo Seppuku, o suicídio cultual e culturalmente realizado por samurais e ronins, no Japão medieval.

Foto: vestida para… o que seria mesmo?

Em termos de hábitos, o japonês sempre adotou tirar os sapatos antes de entrar em casa, de usar máscaras quando resfriado, de comer com a ajuda de hashi’s, de fazer barulho com a boca ao tomar sopa, de baixar a cabeça para demonstrar respeito e de ler HQ’s japonesas (os mangás) no metrô, praças públicas e em casa com a mesma reverência com que os ocidentais leem Dostoiévski, Shakespeare, Fernando Pessoa ou Guimarães Rosa (lembrando que a leitura, no Japão, é de “trás para a frente” e da direita para a esquerda!).

No tocante ao erotismo e sexualidade – com seus naturais desdobramentos no âmbito matrimonial e no trato com as diferenças de gênero na sociedade – isso não seria diferente.

Unindo erotismo aos mangás e à também prolífica produção de animações japonesas (animes), tem-se os hentai’s (hq’s erótico-pornográficas) e os animes eróticos, bastante consumidos em todo o mundo, haja vista a grande liberdade para lidar com temas considerados tabus em outras culturas, principalmente no tocante ao incesto e à submissão feminina.

Chega-se a pensar que o baixo índice de crimes sexuais do Japão tenha alguma relação com a ampla produção erótico-pornográfica do país. Estranhamente, apesar dos temas polêmicos e perversões (como a obsessão por tentáculos) que costumam servir de enredo para os hentais, os japoneses, de tempos em tempos, proíbem a exibição explícita da genitália dos personagens das hq’s e animações, bem como dos seus atores pornôs, exigindo a pixalização de órgãos sexuais.

Para além do universo pornográfico ou sexualmente explícito, os mangás e animes podem abordar uma vastíssima gama de temáticas e espectros, indo da mais básica e inocente aventura fantástico-ficcional (como Dragon Ball e Naruto, sucessos absolutos no Ocidente), passando por histórias mais densas e filosóficas (Death Note, Fullmetal Alchemist etc.), violentas (Attack on Titan, Gantz), de comédia (One Punch Man), até romances açucarados (Your Name).

Foto: Divulgação (escolha um desses mangás e se divirta!)

Nesse enorme menu de opções, uma publicação chamou a atenção por seu tema bastante intimista, pela qualidade de seu argumento e desenhos, por sua alta carga erótica não explícita e pela forma delicada com que aborda o delicado tema do casamento e da satisfação sexual da mulher.

Trata-se da série em mangá Kingyo Tsuma (2017, sem tradução para o Português), de autoria de Kurosawa R..

Apesar de não ter lido o mangá respectivo – por realmente não o ter encontrado para venda no Brasil – não foi difícil constatar que se trata de obra bastante respeitada e repercutida no seu país de origem, com boa aceitação no mercado estadunidense, no qual ganhou publicação e tradução.

A poderosa Netflix, atenta a isso, não pestanejou e deu start para a produção de uma série em live-action do mangá de Kurosawa, que ganhou o sugestivo nome de Fishbowl Wives (literalmente, “Esposas de (ou em) Aquário”).

A série, então, no formato de dorama, propôs-se a contar a história de 6 mulheres, todas casadas e moradoras de um condomínio de luxo em Pequim, que sofrem sérios problemas no casamento, seja pela infidelidade, pelo abandono emocional, pelos fetiches estranhos ou até pelo abuso físico e psicológico de seus companheiros, como, neste último caso, é o drama da bela Sakura (interpretada pela lindíssima Ryoko Shinohara), presa a uma união completamente abusiva com o ególatra, arrogante, violento e infiel Takuya (o ótimo Masanobu Ando). Após mais uma das tantas humilhações e agressões físicas e verbais do marido hedonista, Sakura vai parar na loja de peixes-dourados do belo e sereno Haruto (Takanori Iwata, o carente perfeito), onde encontra abrigo, proteção e amor verdadeiros. Mas nada é simples na sociedade japonesa, no tocante aos direitos (e desejos) da mulher, fazendo com que a sofrida Sakura precise enfrentar verdadeira saga para conseguir se divorciar.

Foto: Divulgação (lirismo nipônico com direito à chuva neon!)

Concomitantemente ao drama da protagonista, a série desfila outros casos que, invariavelmente, mostram a insatisfação das esposas pelo fato de se encontrarem presas a matrimônios claramente inadequados e frustrantes, o que as acaba levando a relações extraconjugais, em busca quase desesperada por felicidade e/ou prazer.

É desconcertante para o brasileiro ver a postura passiva e naturalmente submissa das mulheres, sinal do impressionante sexismo machista da cultura japonesa. As mulheres são tratadas, de fato, como objetos ou, como sugere o título, peixes-dourados dentro de aquários, sendo, esta, a principal metáfora da série: afinal, tal espécie de peixe demanda cuidados realmente especiais para que não venham a perecer rapidamente.

Foto: Divulgação (algumas das outras histórias contadas pela série)

E, por mais romântico que possa parecer, é estranhíssima a comparação de mulheres a animais que “precisam” de cuidado, numa postura cultural que lembra muito a ideia histórica de que mulheres são dignas/carecedoras do amparo masculino.

Mesmo com essa ressalva, é interessante notar o empoderamento, ainda que em níveis altamente subjetivos, que as personagens femininas retratadas na série alcançam, cada uma a seu jeito, mas sempre dentro da moldura cultural nipônica.

Tudo isso é mostrado em ritmo mais lento do que as costumeiras séries norte-americanas (e até mesmo coreanas), sempre embaladas por uma trilha sonora melancólica (beirando à “melosa”), com bastante drama, lágrimas e lirismo.

A fotografia é belíssima, oscilando entre ambientes fechados e abertos com igual desenvoltura, conservando os tons neons que os japoneses tanto gostam. Unindo isso a uma ótima cenografia, observe como a loja de peixes-dourados, apesar de repleta de coisas e corredores estreitos, é muito mais aconchegante que os amplos apartamentos com bela vista de Tóquio do condomínio de luxo que serve de base para a maioria das narrativas.

As cenas de sexo da série são de bom gosto – apesar do aparente desconforto dos atores envolvidos – com discreta nudez dos artistas (à exceção de uma atriz, que parece ter sido contratada para aparecer de topless), ao contrário da hq de origem, onde os momentos “hot’s” são quase explícitos e com destaque para as cenas de abuso.

Foto: Divulgação (ops! tirem as crianças da sala!)

A direção é segura e retira boa dose de dramaticidade de seus atores, intercalando as várias histórias de forma orgânica e sem as confundir.

O final da série, apesar de não ser triste, deixa um gosto amargo na boca, bem típico da produção cultural japonesa.

Desse modo, se você procura algo diferente, um pouco mais cadenciado, com alguma dose de erotismo elegante e orientalizado, Fishbowl Wives é excelente pedida para assistir a dois, tomando vinho e comendo queijo, ou talvez saquê com sushi e salmão.

Embarque nessa viagem nerd à cultura japonesa, com o oferecimento do Nerdtrip.

Foto: Divulgação (como é difícil sair do “aquário”…)


Nota: 3 / 5 (bom)

 

 

 

 

 

 

 

 


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Sou um quarentão apaixonado pela cultura pop em geral. Adoro quadrinhos, filmes, séries, bons livros e música de qualidade. Pai de um lindo casal de filhos e ainda encantado por minha esposa, com quem já vivo há 19 bons anos, trabalho como Oficial de Justiça do TJMG, num país ainda repleto de injustiças. E creio na educação e na cultura como "salvação" para nossa sociedade!!

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