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Críticas

RENFIELD: DANDO O SANGUE PELO CHEFE | Crítica do Neófito

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Algo bastante comum nas produções audiovisuais acerca dos misteriosos, sinistros e sedutores vampiros é a presença da figura do servo do vampiro, ou seja, um leal e dedicado humano (zumbificado ou mutado), encarregado de cuidar do seu mestre durante as perigosas horas diurnas ou de conseguir alimento para ele. Vide, por exemplo, os filmes A Hora do Espanto (1985); Um Vampiro no Brooklin (1995); Deixe Ela Entrar (2009) e Convite Maldito (2022), cujos servos têm destaque na trama.

Esses personagens, todavia, têm por base Renfield, criado pelo irlandês Bram Stoker no seu mundialmente renomado romance Drácula, de 1897, o qual, motivado pela esperança de também se tornar um chupador de sangue imortal, é caracterizado como o louco e fiel lacaio do mais famoso vampiro da cultura pop, além de conhecido por sua peculiar dieta à base de insetos.

No cinema, Renfield foi primeiramente vivido pelo germânico Alexander Granach, no clássico Nosferatu, de 1922, numa caracterização bastante caricata para os padrões de hoje. Em 1931 foi a vez do norte-americano Dwight Frye dar corpo e muitas caras e bocas ao assecla de Drácula, numa performance marcante. É possível, porém, que a interpretação mais facilmente lembrada do personagem seja a do músico e ator Tom Waits, no hoje já distante – mas atemporalmente bom – Drácula de Bram Stoker, dirigido por Francis Ford Coppola, em 1992.

Foto: Divulgação Internet (que tal um churrasquinho de grilo com barata?)

Nesta esteira, quando a Universal tentou pela primeira vez emplacar seu universo compartilhado de monstros – ideia abandonada após o fracasso relativo de Drácula: A História Nunca Contada (2014, estrelado por Luke Evans) e o fiasco retumbante de A Múmia (2017, estrelado por Tom Cruise) – muito se falou na criação de um filme solo sobre Renfield, a partir de uma ideia concebida pelo quadrinista e roteirista Robert Kirkman (Walking Dead), chegando-se à contratação do roteirista e do diretor para a empreitada (respectivamente, Ryan Ridley e Dexter Fletcher).

Como deve ter sido possível perceber, a coisa não deu muito certo na época, deixando o projeto na gaveta por alguns anos, até ser ressuscitado pelo renomado estúdio, após o inesperado sucesso de O Homem Invisível (2020), que novamente despertou a esperança de se conceber o tal “Dark Universe” com os monstros clássicos da literatura e cinema.

A claquete para o filme do servo de Drácula, assim, foi entregue ao diretor relativamente inexperiente Chris McKay, cujo único filme “memorável” é o regular A Guerra do Amanhã (2021). Fora esse longa de ficção científica, McKay codirigiu algumas das animações da LEGO, e é roteirista do tenebroso Dolittle (2020). E assim surge Renfield: Dando o Sangue pelo Chefe (cujo título em Português é mais uma dessas “pérolas” de mau gosto das distribuidoras nacionais!).

Talvez em compensação pelo risco de se entregar tal produção nas mãos de um cineasta de currículo tão modesto, a Universal investiu num elenco forte que, se não formado pelo primeiro escalão de estrelas hollywoodianas, é composto por um astro e rostos conhecidos e competentes.

Para o protagonista, escalou-se o versátil Nicholas Hoult, que cresceu fazendo cinema, primeiramente em Um Grande Garoto (2002), seu primeiro sucesso; passando pelo personagem Fera da franquia cinematográfica dos X-Men; o coadjuvante albino Nux, de Mad Max: Estrada da Fúria (2015); o papel principal em Meu Namorado é um Zumbi e Jack: O Caçador de Gigantes (ambos de 2013), além de um interessante filme erótico, Newness (2017).

Dividindo as atenções com Hoult, tem-se Awkwafina, conhecida por seus papeis cômicos e/ou excêntricos e histriônicos – vide Oito Mulheres e um Segredo (2018); Jumanji: Próxima Fase (2019); e Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis, (2021) – aqui escalada como a incorruptível policial Rebecca Quincy, relegada a funções subalternas numa delegacia de Nova Orleans, mas que acaba se vendo responsável por investigar as mortes decorrentes do fato de se ter a violenta gangue Lobo atuando e, sem saber, o maior dos vampiros escondido no submundo de sua cidade.

E, para coroar o elenco, tem-se, dando “vida” a um Drácula fenomenal, o oscarizado Nicolas Cage que, após ter quase aberto falência pessoal nos anos de 2008-2009 – passando a trabalhar em qualquer produção que lhe ajudasse a quitar sua enorme dívida de 6 milhões de dólares –, retorna, 16 anos após O Motoqueiro Fantasma (2007), a uma produção de grande estúdio. E, apesar de tecnicamente ser coadjuvante em Renfield: Dando o Sangue pelo Chefe, o sobrinho de Francis Ford Coppola  rouba todo e qualquer segundo que surge em cena, sendo o que de fato vale o ingresso do filme.

O elenco de apoio ainda conta com Ben Schwartz, como Teddy Lobo, no tradicional papel do filho bandido que quer se provar para a mãe e maior mafiosa da cidade e que, no caso, é vivida por Shohreh Aghdashloo, belíssima, no auge de seus 70 anos de idade.

Há, também o núcleo do grupo de apoio a pessoas presas em relacionamentos abusivos, que ocorre na igreja que o personagem de Renfield passa a frequentar, e uma porção de capangas genéricos, todos potencialmente servindo para serem criativamente mortos ao longo da produção.

O roteiro de Renfield não tem medo de abraçar o absurdo e o exagero, optando, em seu enquadramento geral, pelo gênero que, aqui no Brasil, seria chamado de “terrir” (terror + rir ou comédia de horror). A fotografia de Mitchell Amundsen reflete o tom cartunesco do filme, abusando da paleta de cores e discretos tons de neon. Todavia, o longa também flerta com o gore, haja vista os litros de sangue oriundos das diversas decepações, decapitações e mortes variadas levadas a efeito na uma hora e meia de duração do filme.

Há, também, a sugestão de romance entre os personagens de Awkwafina (Rebecca Quincy) e Nicholas Hoult (Rendfield) que, infelizmente, não se concretiza; uma pequena dose de melodrama em torno da história familiar e profissional da mesma Rebecca; relances de terror leve, haja vista a caracterização de Drácula – com destaque para sua macabra dentição –; e cenas de aventura que, apesar de bem feitinhas, não possuem nada de original, emulando – de longe! – a franquia John Wick, e alguns recursos utilizados (e datados), como as tomadas de raio-X do longínquo Romeu Tem que Morrer (2000). Os “poderes” do protagonista também são justificados e retratados de forma caricatural, sem nenhuma lógica mais coerente ou aprofundada, lembrando um antiquíssimo personagem das hq’s da Disney, o Superpateta, cujos poderes advinham da ingestão de superamendoins.

Foto: Divulgação (um casal “fofo”, mas com 70 anos de diferença etária!)

O longa também se mostra extremamente reverente ao filme Drácula, de 1931, iconicamente estrelado por Béla Lugosi (para sempre estigmatizado no papel), inclusive com certas cenas reproduzindo momentos explícitos daquela produção e, claro, também, pela caracterização, trejeitos e personalidade do Drácula vivido por Nicolas Cage.

Em resumo, Renfield: Dando o Sangue pelo Chefe se mostra sem personalidade, oscilando entre vários gêneros e subgêneros, mas sem abraçar nenhum completamente, a não ser o da comédia escrachada (quase nos moldes dos antigos Loucademia de Polícia) que, em tese, justificaria qualquer absurdo ou experimentação.

No entanto, ao se escrever isso, pode-se ter a impressão de que Renfield é um filme muito ruim; o que não é o caso!

A uma hora e meia do filme passa extremamente rápida e o filme diverte, arrancando risos espontâneos em várias cenas. Ocorre uma inesperada e bem-vinda química entre os absolutamente diferentes Awkwafina e Nicholas Hoult – a ponto de se torcer para uma cena explicitamente romântica entre seus personagens –; e as cenas de ação, ainda que não inovadoras, são ágeis e divertidas.

Mas, acima de tudo, o filme conta com Nicolas Cage em sua melhor forma! O ator parece ter se divertido horrores com seu personagem, estando completamente à vontade e senhor de si, dando um show de presença em tela. Sem qualquer nuance anti-heroica ou dramática, seu Drácula é o mal encarnado, enxergando os humanos como ou servos ou comida, enquanto, a si mesmo, como a um “deus”. Sua ironia, sarcasmo e vilania são adoráveis de se assistir. Ao final do longa, fica-se com vontade de ver mais Drácula, proporcionalmente sedutor e assustador. Um gol de placa!

Outro pequeno acerto do filme são os créditos finais que, se não contam com nenhuma cena extra, colocam por trás do letreiro cenas deletadas que não foram para ao corte final.

No frigir dos ovos, Renfield, apesar de suas deficiências explícitas, é um filme que merecia ser visto, apesar da sua fraquíssima campanha de marketing, até o momento, que certamente condenará a produção a se sustentar no cinema graças ao boca-a-boca, mas mais certamente obtendo sobrevida nas plataformas de streaming, uma vez que não se trata de um longa que necessariamente “precisa” ser assistido no cinema. Uma pena. Poderia ser o retorno, em grande estilo, do sobrinho de Coppola ao primeiro time de Hollywood, após tantos anos de produções medíocres.

Ainda assim, quem se dispuser a ir até ao cinema, vai sair da sala com aquela boa sensação de relaxamento, após assistir a uma comédia que convence.

Até a próxima viagem, tripulantes!

Foto: Divulgação (dá um sorriso para a foto?)


Nota: 3,5 / 5 (bom)

 


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Sou um quarentão apaixonado pela cultura pop em geral. Adoro quadrinhos, filmes, séries, bons livros e música de qualidade. Pai de um lindo casal de filhos e ainda encantado por minha esposa, com quem já vivo há 19 bons anos, trabalho como Oficial de Justiça do TJMG, num país ainda repleto de injustiças. E creio na educação e na cultura como "salvação" para nossa sociedade!!

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