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Críticas

WATCHMEN SÉRIE | Crítica do Neófito (S01E09)

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Foto: Divulgação

ALERTA DE SPOILER!!!!!!

(Este texto pode, eventualmente, abordar elementos da trama)

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Começando meia hora mais tarde, ou seja, às 23h30m do dia 16/12/2019 – em razão do também último episódio do estranho programa brasileiro A Vida Secreta dos Casais – a série televisiva Watchmen – passada no mesmo universo da aclamada graphic novel homônima criada por Alan More e Dave Gibbons, e produzida pela HBO e Damon Lindelof (Lost) – transmitiu seu último e derradeiro capítulo 9, chegando ao seu fim em grande estilo.

Repleta de grandes expectativas por parte da legião de fãs da icônica HQ, a série teve um primeiro episódio absolutamente impactante, um desenvolvimento razoável e algo lento até o quinto episódio, e muitas reviravoltas e revelações – algumas delas subvertendo, de certa forma, algumas das premissas deixadas pelo texto de Moore, mas todas totalmente reverentes e muito bem estruturadas sobre o cânone dos quadrinhos – do episódio 6 em diante.

(SPOILER) Após a revelação no final do 7º episódio, de que o até então pacato marido da protagonista, Angela Abar/Sister Night, Calvin Abar (Yahya Abdul-Mateen II) era, na verdade, o Dr. Manhattan tentando levar uma vida “normal” de humano (coerente com a sua “re-humanização” no último capítulo da HQ), e o excepcional episódio 8, no qual a vivência temporal peculiar do personagem foi trabalhada de forma magistral, restava apenas mais um episódio de 50 minutos para dar fim ao que já havia sido revelado e para concluir alguns nós que ainda não tinham sido desatados.

E aí, começa o drama de tecer comentários críticos sobre a série.

Por que “drama”?

Já me explico!

Uma das coisas importantes a serem aprendidas ao se criticar obras artísticas é conseguir analisar a obra que foi vista ao invés daquela que se queria ver.

Preciso confessar que, na minha visão pessoal, algumas das decisões criativas do showrunner Lidelof com relação a alguns dos personagens oriundos diretamente dos quadrinhos não me agradaram totalmente, pois, na minha memória afetiva ou concepção pessoal sobre eles, deveriam ter tido um tratamento diferente.

Nesse sentido, entendo que Lindelof – assim como fez Alan Moore ao questionar em sua graphic novel como seria o mundo se vigilantes e um super-homem realmente existisse – resolveu, com base no realismo do live-action, perquirir como seria se realmente (em carne e osso) tais vigilantes e sobre-humano existissem, uma vez que, apesar de todo o realismo estabelecido por Moore na HQ, ainda se tratava de uma obra em quadrinhos, praticamente sem limites para o estabelecimento de elementos criativos e fantásticos, enquanto que, numa transposição para atores de verdade e cenários físicos reais, as limitações passam a ser bem mais evidentes.

(SPOILER) Por exemplo, a Laurie Blake/Espectral de Jean Smart foi introduzida de forma bastante fluida na trama e sua personalidade irônica e amarga guardam coerência com o encaminhamento que ela teve nos quadrinhos; mas me incomodou a falta de uma maior capacidade física da personagem, que, segundo a narrativa de Moore, passou toda a infância e juventude treinando, e boa parte da vida adulta atuando como vigilante mascarada. Por mais que a idade – e os abusos de cigarro e bebida, comuns à personagem – cobre um preço físico alto, penso que ela precisaria ter apresentado, ainda, alguns reflexos e condição de luta diferenciada (vide Jackie Chan e sua habilidade física real aos 65 anos de idade!).

Foto: Divulgação

(SPOILER) O mesmo se aplica a Adrian Veidt (Jeremy Irons), o personagem – na minha opinião pessoal – que mais se distanciou de sua concepção original nos quadrinhos. Por mais que o peso de suas ações – matar 3 milhões de pessoas – devesse, de fato, pesar na sua saúde mental, sua personalidade excêntrica, num sentido pejorativo, não me agradou desde o primeiro episódio. De todos os personagens de Watchmen, Veidt deveria ser o mais fisicamente habilidoso, mesmo com o peso da idade, haja vista sua extrema disciplina, método, autocontrole, meditação e foco. Um homem de mais de 70 anos ainda capaz de segurar um tiro de bala com as mãos não poderia ser – nunca! – subjugado por um outro humanoide comum. O histrionismo cômico de sua personalidade foi extremamente bem defendida pelo excepcional Irons, mas, para mim, ficou muito longe do personagem conforme a caracterização conferida por Alan Moore. Seu desfecho na série também destoa um pouco (bastante, para falar a verdade) do que esperava ver. Facilmente derrotado e exposto ao mundo, tornando sua ação de 34 anos atrás praticamente inválida, apesar da mensagem de esperança embutida, quando da fala de Laurie Blake.

Foto: Divulgação

(SPOILER) Por último, na minha visão (reforço novamente que a partir de minhas próprias interpretações dos quadrinhos), o Dr. Manhattan nunca seria pego em artimanhas como a que foi criada na série. No meu entender, ele já se encontraria numa condição muito acima da humana, sendo inconcebível seu aprisionamento e posterior morte. O fato dele ter se apaixonado por Angela ainda é aceitável e sua transformação física também, haja vista seu renovado interesse pelo ser humano (final da HQ), mas não sua vulnerabilidade tão evidente e notória. Alguém capaz de alterar sua massa e composição física para alcançar os 30 metros de altura e vivenciação simultânea do passado, presente e futuro não seria destruído ou “sugado” por artefatos humanos tão “básicos” como os mostrados na série.

Foto: Divulgação

Analisados tais elementos do que eu gostaria de ter visto, cabe agora considerar o que foi efetivamente visto.

(SPOILER) A vulnerabilidade e assassinato de Manhattan, nesse sentido, foram muito bem trabalhadas. O “egoísmo” do personagem, um verdadeiro “deus”, que poderia ter feito muito mais pela humanidade, mas preferiu ficar brincando de casinha numa lua de Júpiter, é o que justifica sua morte. Chega a ser nietzschiano essa “morte de Deus”: um criador muito distante de sua criação, a quem deveria proteger, acaba sendo esvaziado de sentido. As criações humanoides de Manhattan – réplicas de uma boa lembrança da infância – totalmente desprovidas de livre-arbítrio, iguais e subservientes, representam a visão do personagem (na concepção de Lindelof) sobre os seres humanos em geral. Lembra um pouco a extraordinária fala de Bill em Kill Bill volume 2, sobre sua interpretação acerca do Superman. No fim, o que restou ao personagem, em seus últimos momentos, foram suas lembranças como um homem negro comum, casado com um mulher a quem ama e com filhos adorados (e o fato de ser “negro” é essencial à análise, pois, isso traz em si a questão do preconceito institucionalizado, da exclusão social estrutural, muito bem explicitado na ideologia da Sétima Kavalaria). A metáfora e mensagem são belíssimas e muito bem conduzidas pelos criadores da série.

É tentador interpretar também a decantada necessidade do multibilionário Adrian Veidt de ajudar a humanidade – mas do seu jeito e ainda que isso represente o sacrifício de milhões de vidas – como uma metáfora aos donos do dinheiro e do poder político – além dos economistas (ditos) extremamente liberais – os quais tomam decisões visando o bem geral, ainda que, no processo, esse geral seja o maior impactado, pagando um enorme preço. Mas isso, talvez, seja politizar em excesso as pretensões da série, mesmo considerando a introdução, na trama, do massacre de Tulsa – escondido, de fato, por décadas pelo governo norte-americano –; o alto caráter racista e discriminatório da origem de Hooded Justice (episódio 6) e ameaça da Sétima Kavalaria; e as pretensões ególatras e megalomaníacas da verdadeira vilã (uma espécie de Lex Luthor radical de saias), a Madame Trieu (Hong Chau), que, não à toa, também é uma super-empresária.

Foto: Divulgação

Este último episódio pode ser elogiado por ter caprichado mais na caracterização de Dr. Manhattan – que ficou um pouco a dever, segundo o acalorado debate levado a efeito nas redes sociais a respeito do episódio 8 –, pelo aspecto técnico e dramatúrgico; mas pode ser criticado por uma certa correria do roteiro, que condensa muita coisa em pouco tempo, tornando algumas das surpresas e reviravoltas meio forçadas. (SPOILER) A mortal chuva de “lulinhas” congeladas criada por Veidt para salvar o dia, por exemplo, só causa prejuízo no exato local onde era necessário, sem maiores repercussões; a numerosa Sétima Kavalaria meio que desaparece da trama. Lindelof abraça de vez o aspecto fantástico da trama neste último capítulo, abrindo mão de muito do realismo que vinha mantendo até então, lembrando, em última instância, de que se trata de uma história retirada de uma revista em quadrinhos, mas apenas naquilo que se mostrava conveniente para sua trama.

Foto: Divulgação (o sanguinolenta conclusão do cruel líder da Sétima Kavalaria)

De toda forma, porém, é preciso admitir que a série foi, em geral, muito coesa e coerente, além de possuir uma mensagem forte e atual.

O papel do negro – a partir do núcleo de Angela Abar – e do imigrante – no caso, simbolizado pelos vietnamitas e vietcongues, cujo país é anexado (incorporado) aos EUA – é de fundamental importância para a trama criada por Lindelof (que, aliás, introduz um irônico casal gay interracial na figura de Will Reeves novo e o Capitão Metrópolis, novamente no episódio 6). Discute-se, aqui, a inclusão, o racismo e a intolerância.

A heroína se trata de uma mulher negra bad ass (Angela Abar/Sister Night), que, ao final, pode ser aquela a quem caberá o poder de dar rumo à humanidade. Mais política e feliz essa mensagem impossível!

Watchmen, a série, não chega a ser tão grande como sua contraparte quadrinística – deixando algumas perguntas no ar: quem, afinal, era aquele personagem magricela uniformizado, que se joga óleo e escorrega para dentro de um bueiro??? – mas, sem dúvida alguma, tratou-se de um programa de altíssimo nível técnico, de roteiro intrincado e reverente ao seu material de origem e muitíssimo bem realizado. Uma série para marcar época, para mostrar que há formas inteligentes e respeitosas de lidar com materiais canônicos, bastante crítica e relevante.

Tomara que a HBO queira fazer outra temporada e que Lindelof ainda tenha o que dizer sobre esse fascinante universo concebido pelo recluso bruxo inglês.

Que pena que, por enquanto, parece que acabou mesmo!!!

Foto: Divulgação

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Nota: 3,5 / 5 (muito bom)

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Sou um quarentão apaixonado pela cultura pop em geral. Adoro quadrinhos, filmes, séries, bons livros e música de qualidade. Pai de um lindo casal de filhos e ainda encantado por minha esposa, com quem já vivo há 19 bons anos, trabalho como Oficial de Justiça do TJMG, num país ainda repleto de injustiças. E creio na educação e na cultura como "salvação" para nossa sociedade!!

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